Desde que o rei ascendera ao trono, tudo corria
bem naquele reino distante, outrora assolado por contínuas guerras.
O soberano era ao mesmo tempo forte e bondoso.
Dominava como ninguém a arte militar e possuía tropas bem treinadas, mas preferia
alcançar a paz através de amistosos tratados. Por isso, visando a glória de
Deus e o bem do seu povo, havia assinado já acordos de cooperação com a maior
parte dos estados limítrofes.
As aldeias do reino estavam em pleno
desenvolvimento e os negócios com os estados vizinhos eram bastante prósperos.
O clima ameno favorecia o plantio dos mais diversos vegetais, e até a natureza
parecia estar ajudando a tornar aquela região semelhante a um paraíso.
Os habitantes eram laboriosos, solidários e
piedosos. As igrejas estavam sempre cheias e os Sacramentos eram muito
frequentados. Reinava entre todos um espírito de fraternidade cristã que fazia
lembrar o mandamento novo de Jesus: “Como eu vos tenho amado, assim também vós
deveis amar-vos uns aos outros” (Jo 13, 34).
Porém, o tempo passou e o temperamento dos habitantes do
reino foi mudando... Acostumando-se a viver na prosperidade, perderam o
espírito de sacrifício e de luta. Já não queriam saber de vencer quaisquer
dificuldades, por pequenas que fossem, e o menor problema despertava entre eles
muitas queixas.
O rei ficou preocupado. A paz e a tranquilidade, que tanto
esforço tinha custado, deram ocasião à mediocridade de espírito da população.
Ao mesmo tempo, as rixas entre os seus súditos aumentavam. O espírito comodista
tornara-os irritadiços e egoístas.
Decidiu
expor ao Bispo suas inquietações e ambos conversaram longamente. O prelado
também sofria com a decadência moral do povo, sobretudo vendo os Sacramentos serem
cada vez menos frequentados.
Ora, o que fazer? Como ajudar o povo a perceber a decadência
em que estava caindo? Como afastá-lo do egoísmo e compenetrá-lo da necessidade do
sacrifício e da luta nesta vida? Depois de muito pensar e trocar ideias, prelado
e soberano arquitetaram um projeto...
Naquela mesma noite, o monarca chamou à sua presença um
pelotão escolhido de soldados e um grupo de servidores da maior confiança para lhes
expor o plano, exigindo deles o mais rigoroso segredo.
Logo que amanheceu, as instruções do rei começaram a ser executadas.
Os soldados dirigiram-se à principal via de acesso ao reino e a cercaram.
Ninguém podia se aproximar do lugar onde alguns operários executavam um
misterioso serviço. Os habitantes da região, curiosos, tratavam de adivinhar ao
longe em que consistia, contudo nada alcançavam ver.
Por fim, o caminho ficou liberado... Bem, não exatamente: no
meio dele havia agora uma enorme pedra!
Passaram por ali mercadores e homens ricos do reino. Ainda
que com certa dificuldade, contornavam a rocha, aparentando indiferença. Alguns,
mais exaltados, esbravejavam contra o rei, queixando-se pelo estado em que era
mantida a estrada, mas também nada faziam para remover o empecilho.
Em pouco tempo a notícia correu por todo o reino. Não havia
quem não reclamasse contra aquela volumosa rocha que tanto atrapalhava o passo
das carruagens em uma das vias mais importantes do país; entretanto, ninguém
tomava a menor iniciativa para resolver o problema.
Um belo dia, chegou junto à pedra o senhor Fabiano. Era um
pequeno agricultor, de olhos vivos e corpo esguio, que todas as semanas utilizava
a mesma estrada para levar ao mercado as frutas e verduras da sua horta.
Ao ver tal obstáculo no meio do caminho, desceu de sua
carroça e, junto com seus filhos, dispôs-se a retirá-lo. Empurraram a pedra com
força, mas ela nem se mexia... Procuraram madeiras para usá-las como alavanca, e
foi em vão. Cansados pelo esforço, porém sem desanimar, pararam um pouco para
tomar alento.
Senhor Fabiano estava indignado. Como era possível uma
simples rocha resistir-lhes desse modo? Não haviam eles retirado milhares de
pedras em sua horta, e até maiores, para torná-la mais fértil? Não construíram
uma barragem desde o rio vizinho, para melhor regar os legumes? E, depois, o obstáculo
não só atrapalhava a eles, senão a todos os que por ali passavam...
Um tanto recuperados, senhor Fabiano e seus filhos voltaram à
tarefa. Juntos rezaram uma “Ave Maria”, como sempre faziam antes de iniciar o
trabalho no campo, e unidos em um só esforço conseguiram afinal remover a
grande rocha.
Alegres e satisfeitos, já se dispunham a subir de novo na
carroça, quando entreviram, em meio à poeira levantada, algo singular. Era uma
bolsa de fino couro repleta de moedas de ouro, com um pergaminho, onde estava
escrito: “Este é o prêmio para os valorosos que removerem da estrada a incômoda
pedra. A vida está cheia de obstáculos e precisamos estar sempre em luta para
vencê-los”. Estava assinado pelo próprio rei!
O fato rapidamente se tornou conhecido e o povo aprendeu a
lição: tornaram-se moles e acomodados. O menor esforço lhes causava aflição. Diante
de qualquer dificuldade preferiam reclamar em lugar de tentar resolvê-la.
No domingo seguinte, as filas dos confessionários se encheram
e as Missas em todas as igrejas estiveram repletas. E o senhor Bispo, na principal
Celebração da Catedral, aproveitou a ocasião para dizer no sermão:
— Os obstáculos em nossa vida são excelentes ocasiões para
compreendermos ser a existência do homem nesta Terra uma luta. Sejamos
solidários uns com os outros e ajudemo-nos nas dificuldades. Mas, sobretudo, lembremos
sempre de pedir o auxílio de Maria Santíssima antes de enfrentar qualquer
problema, por pequeno que ele seja.
Com a ajuda da graça divina, o plano do rei e do Bispo chegara
a bom termo: aquela pedra havia sido instrumento para que o povo caísse em si e
voltasse a ser valente, disposto a fazer qualquer esforço para o bem do reino e
maior glória de Deus.
Irmã Michelle Viccola, EP - Revista Arautos do Evangelho n.112 abr 2011
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